quarta-feira, 22 de julho de 2015

Ninguém precisa suportar a cadeira


Hoje li o texto de um cadeirante que descrevia o quanto sua namorada tinha aberto mão da “linda vida dela” pra ficar com ele, e sobre ela ter “aceitado”. Foi inevitável não me sentir triste com as palavras dele, não por mim porque eu não concordo com o que ele escreveu, mas pela quantidade de pessoas que tem alguma deficiência física e acreditam que quem está próximo, abriu mão de alguma coisa pra isso. E quem foi que disse que a namorada do autor do texto não tem uma linda vida agora, ao lado dele? Só porque ela empurra a cadeira dele até suar, e acorda a noite pra ajudá-lo a se virar na cama, como ele mesmo descreveu? Acha mesmo que se a vida dela não fosse bonita ao lado dele, ela permaneceria onde está? Vivencio diariamente a visão errada que as pessoas têm sobre cadeirantes, e poderia escrever uma lista enorme com as pérolas que já ouvi por aí. Desde “admiro você por sair na rua” até “Jesus te ama”, como se eu não soubesse! Jesus também ama você, tá. Me incomoda, e não é pouco, quando olham pra nós como se fosse difícil ir pra um bar, difícil estudar, difícil trabalhar, difícil se divertir. Ok, rola uns degraus nas ruas, e uns buracos nas calçadas, mas pra isso se classificar como difícil vai depender muito da forma como eu interpreto tudo isso. Pra mim, usar uma cadeira de rodas ou andar com as próprias pernas só altera a minha altura, de resto eu só tenho a ganhar! A cadeira me trouxe uma visão privilegiada da vida, cresci uns dez anos em dois, e estou longe de me considerar satisfeita de aprender como muita gente por aí. Aprender se tornou um hobby, perceber se tornou um vício e mudar virou rotina. E a mais drástica e boa mudança pela qual eu passei é entender que se tem alguém do meu lado é porque essa pessoa quer, é porque tenho a acrescentar na vida dela, é porque estar do meu lado é bom! E não aceito menos que isso para eu também ficar ao lado de alguém, e faço questão de me afastar de quem me olha como se eu tivesse 5 anos. Eu vivo muito bem, nem sempre o que eu digo é bem aceito, mas isso faz parte de quem eu sou, quando eu aceitei me mostrar, aceitei mostrar 100% e não a metade. E não, vocês não vão me ver dizendo que meu namorado abriu mão de uma linda vida pra poder ficar do meu lado, porque posso garantir com um milhão de palavras, se necessário, que nós dois juntos temos uma vida mais linda do que tínhamos antes de nos conhecer. E não me rebaixo jamais a pensar que eu preciso de pessoas solidárias, o que eu preciso é o que todo mundo precisa, de mais pessoas de verdade, sem máscaras e sem opinião de maioria. E se você quiser se aproximar mas me considera um vítima da vida, então nem chegue, porque aqui não tem lugar pra você.


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